Desde o fim de grandes sagas cinematográficas como Harry Potter, Senhor dos Anéis, chegando até a produções televisivas como Game of Thrones, as produtoras da sétima arte buscam uma nova franquia, seja ela vindo dos livros ou de qualquer outra mídia – com preferência a primeira opção – que consiga perdurar tempo suficiente para arrecadar milhões, se não bilhões para seus acionistas. Mas podemos contas nos dedos da mão quantos tiveram tanto sucesso quanto o que já mencionamos acima, enquanto a outra parcela acaba ficando obscurecida ou restrita a um público pequeno. Tudo bem que mais recentemente algumas destes romances e histórias vem ganhando seu espaço e mostrando o quão incríveis suas histórias são, mas sempre há quem derrape. E não tem melhor exemplo de uma derrapagem complicada quanto Artemis Fowl, produção da gigante Disney, planejada para o cinema e que teve seu sonho da tela grande destruída devido a pandemia, e foi para sua plataforma de streaming, e que está já disponível no Brasil.
Artemis Fowl segue um jovem de mesmo nome, conhecido como um grande ladrão que conhece o reino das fadas. Quando seu pai desaparece e o mundo o trata como ladrão, Artemis tenta achá-lo, mas uma figura obscura acaba pedindo em troca de seu pai um artefato de fada, que fora escondido pelo seu pai. Contando com sua inteligência acima do normal, e com a ajuda de seu braço direito, Artemis planeja capturar uma fada que lhe dê a localização de tal artefato.
A pergunta que fica após assistir mais de noventa minutos é: por que Disney? Fica difícil defender o grande estúdio que teve em seu cerne dar vida a contos de fadas e encantar a criança interior com magia, fantasia e lições morais intricadas em sua narrativa. Fica ainda mais difícil ao saber que assisti Artemis Fowl após ter assistido o live-action de A Dama e o Vagabundo – o que pode não ter qualquer valor, já que a história dos cachorros é basicamente uma reciclagem de uma história já trabalhada antes pelo estúdio. O pior – e deixei para o final – é que o plano inicial era lançar Artemis Fowl nos cinemas, e A Dama e o Vagabundo não. O que faz pensar que foi uma decisão sabia lança-lo direto no streaming.
Já acompanhei inúmeras sagas literárias, e vi suas adaptações cinematográficas e seriadas, algumas foram muito bem adaptadas, outras nem tanto, mas o grande problema de Artemis Fowl é que parece que ninguém lapidou a ideia de adaptação. O protagonista é um dos mais desinteressantes que já acompanhei – e sofri com Bella Swan, tanto no livro quanto nos filmes – e mesmo que tente criar uma empatia à lá Dr. House, a imagem de Artemis não passa de uma criança arrogante. O braço direito de Artemis passa apenas a sensação de bodyguard genérico com um olho que você vai acreditar que ele é do reino das fadas, mas não, é só porque queriam deixá-lo com um olho azul elétrico mesmo. Sua sobrinha, que entra com o pretexto de ser quase que uma especialista em artes marciais e protetora de Artemis é facilmente descartada, aparece na sua apresentação, e só volta a ser “relevante” quanto está sendo atacada por um ogro, e esquece totalmente seus (poucos) anos de luta.
A fada que acaba sendo capturada pelo protagonista, até que tem certo carisma, mas toda sua presença é reduzida a um meio para o grande plano da mente brilhante do Artemis que começa como refém, e dois de dez minutos se torna a melhor amiga de seu captor. Ela também serviria para o telespectador como a ponte para nos apresentar o reino dos fey, o que não acontece. É jogado a todo momento as criaturas que lá vivem, assim como os personagens, e você assiste as cenas não se importando com os eles, e quando eles voltam você esquece de sua existência.
O roteiro parece que queria mostrar a genialidade do jovem de 12 anos, e como sua habilidade para ser um grande ladrão o ajudará nas próximas aventuras de possíveis sequências, mas você acaba não se importando com nada do plano, ou das descobertas, pois elas são jogadas para você. E todo o filme acaba ficando restrito a mansão Fowl, sobrenome que causa certo desconforto para as fadas, principalmente para Judi Dench, a fada mais experiente, mas você começa sem saber de nada, e termina pior do que começou.
Em nenhum momento o filme te entrega um motivo para você se importar com este universo, e isso é triste para os fãs da saga literária. Como um grande fã de Harry Potter, eu sinto que àqueles que assim como eu cresceram acompanhando uma saga, e quando vemos um material audiovisual sendo produzido da forma como Artemis Fowl chegou para o grande público, chega a ser desrespeitoso, pois como um não conhecedor deste universo, nada me fez querer conhecer os detalhes da saga de Artemis Fowl, Holly Short e Mulch.
Para não trazer só analises negativas, o filme até tem algo bom, os efeitos visuais do Mulch quando ele vai cavar, os visuais tecnológicos e bem coloridos das fadas – o que faz nos questionar onde que a magia entra neste mundo – mas é só isso.
Artemis Fowl é quase que uma tortura. Estou sendo um pouco exagerado, mas é a mais pura verdade. Uma história que não soube se vender, um roteiro que não se entendeu com sua base, uma adaptação problemática e sem qualquer carisma, nenhuma empatia envolvida que nos faça acreditar neste universo e querer conhecer mais, um vilão tão caricato que coloca vilões dos filmes do Disney Channel no patamar de Thanos e Coringa, de tão mal trabalhado e mal resolvido, com o clássico grito de “você me paga, Artemis Fowl”, enquanto o protagonista só passa de uma prodígio arrogante, que não é interessante, e se diz o maior ladrão do mundo, sem que tivesse roubado nada nos 95 minutos de filme.
Artemis Fowl: O Mundo Secreto
Artemis FowlPó de Fada
- Efeitos visuais
Ataque de Trolls
- Protagonista desinteressante, sem empatia e carisma
- Coadjuvantes que você não vai se importar
- Roteiro fraco e com sensação de estar apressando os acontecimentos
- Personagens apresentados e então desaparecidos
- Vilão caricato, de uma forma ruim
- Falta do elemento magia para este universo
- Background de personagens inexistentes, que faz com que você não se importe em nada com sua personalidade, motivações ou sua existência na história